Assistência Social

Para não fechar as portas,entidades assistenciais terão de se adequar à nova legislação

Lizie Antonello

O sistema de atendimento assistencial de Santa Maria está em ebulição. O motivo é o marco regulatório que regra o estabelecimento de parcerias entre as organizações da sociedade civil e a administração pública. A legislação é federal – Lei 13.019 – e foi sancionada em 2014. Santa Maria foi pioneira no Estado na regulamentação, com a publicação do Decreto 35 em fevereiro deste ano. O problema é que nem as entidades, nem a prefeitura se prepararam ao longo desses quase três anos para implementar o que a nova legislação estabelece. Agora, todos correm contra o tempo para regularizar a situação e, com isso, poder manter os serviços em funcionamento.

A lei muda a forma como as parcerias são feitas. Antes, prefeitura e organizações podiam firmar convênios por meio dos quais as entidades prestavam serviços e recebiam repasses dos fundos de assistência nacional e municipal, recursos do caixa livre dos municípios, além de poderem captar doações diretamente nas empresas mediante a apresentação de projetos. 

As fontes de verba continuarão as mesmas, conforme a Secretaria de Desenvolvimento Social. É a relação entre as organizações e o ente público que muda. A legislação estabelece que seja feito chamamento público, uma espécie de licitação simplificada, como ocorre em outras áreas, para definir quem irá prestar o serviço.

 SANTA MARIA, RS, BRASIL. 19/10/2017.Lar de Mirian e Mãe Celita é uma das instituições que terá de se adequar ao marco regulatório, lei 13.019 para manter atendimentos. Entidade faz o acolhimento de crianças e adolescentes dos zero aos 17 anos.FOTO: GABRIEL HAESBAERT / NEWCO DSM
Foto: Gabriel Haesbaert / NewCO DSM

Para isso, as instituições precisam estar adequadas na parte administrativa quanto à documentação exigida e com as prestações de conta dos últimos cinco anos em dia. Por sua vez, a prefeitura precisa estar organizada quanto à análise dos convênios antigos e existentes que serão substituídos e para dar suporte e orientar as entidades sobre a nova legislação.

Mas, por enquanto, o cenário é de dúvidas e de incertezas. Praticamente todas as instituições entregaram à prefeitura os documentos exigidos, mas a maioria tem pendências e precisa justificar gastos dos últimos anos para poder participar do chamamento público e continuar com os atendimentos. Algumas estão inscritas no Cadastro de Inadimplentes (Cadin) municipal e terão de negociar a devolução de valores aplicados indevidamente. A prefeitura não divulga os nomes dessas entidades em função do sigilo fiscal.

Por parte do município, muitos convênios antigos, que, no novo modelo serão termos de colaboração e de fomento e acordos de cooperação, ainda estão sendo avaliados pela Controladoria-Geral. A prefeitura diz que não houve demora para iniciar o processo de análise dos contratos e defende a nova legislação.

– É uma simplificação do processo licitatório e uma democratização e transparência maior no estabelecimento dessas parcerias – declarou o controlador-geral do município, Alexandre Lima.

E a capacitação às entidades?

O Conselho Municipal de Assistência alega que as entidades não foram capacitadas e que tinham poucas informações. Que sabiam apenas que precisavam entregar a documentação aos conselhos de Assistência e do Idoso, dependendo da área de atuação, e que isso foi feito.

 SANTA MARIA, RS, BRASIL. 19/10/2017.Lar de Mirian e Mãe Celita é uma das instituições que terá de se adequar ao marco regulatório, lei 13.019 para manter atendimentos. Entidade faz o acolhimento de crianças e adolescentes dos zero aos 17 anos.FOTO: GABRIEL HAESBAERT / NEWCO DSM
Foto: Gabriel Haesbaert / NewCO DSM

Conforme a Secretaria de Desenvolvimento Social, foram feitos esclarecimentos a quem procurou pela secretaria de forma espontânea no decorrer do ano. Porém, a equipe admite que não foi proporcionada capacitação para as entidades nem em anos anteriores, nem neste.

A desinformação gerou um clima de insegurança e incerteza entre os funcionários das entidades. Mas o momento atual é de regularização e de busca de soluções. Afinal, as instituições precisam dos recursos públicos para não fechar as portas, a prefeitura precisa das entidades porque não tem condições de prestar os serviços, e, principalmente, as pessoas assistidas não podem ficar sem o atendimento.

No dia 18 de outubro, foi promovido, na Câmara de Vereadores, um encontro entre a equipe da secretaria e os representantes das organizações da cidade para tirar dúvidas. Uma capacitação com um auditor do Tribunal de Contas do Estado (TCE) está sendo organizada, segundo a prefeitura, e deve ocorrer até o final deste ano.

De acordo com o auditor do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Valtuir Pereira Nunes, 2017 está sendo considerado um período de transição:

– A contar de 1º de janeiro de 2018, a lei estará valendo integralmente em sua plenitude. 

O auditor está viajando pelo Estado para orientar os técnicos do TCE sobre o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, ja que eles também serão parte do processo no momento em que a lei prevê auditorias tanto nos municípios quanto nas entidades.

 SANTA MARIA, RS, BRASIL. 18/10/2017.O Lar Vila Itagiba de Santa Maria é uma das entidades que deve se adequar à nova legislação para manter atendimento.FOTO: GABRIEL HAESBAERT / NEWCO DSM
Foto: Gabriel Haesbaert / NewCO DSM

O QUE DIZ A LEI 

CHAMAMENTO PÚBLICO
– A Lei Federal 13.019, de 31 de julho de 2014, conhecida como Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, determina um novo regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações por meio de novos instrumentos: termos de colaboração e de fomento, quando a parceria envolve recursos financeiros, e acordo de cooperação, quando não envolve recursos
– O Decreto 35, de fevereiro deste ano, regulamenta a nova legislação em Santa Maria
– A partir da publicação do decreto, o município só poderá estabelecer parcerias com as entidades por meio de chamamento público – espécie de licitação
– A prefeitura fará um edital para selecionar uma ou mais entidades para prestarem determinado serviço (objeto), por exemplo, o acolhimento de crianças e adolescentes ou o atendimento a pessoas com deficiência ou o asilamento de idosos
– O edital pode limitar a abrangência para entidades da cidade ou da região ou ampliar para outros municípios. Ainda pode estabelecer que é preciso mais de uma instituição para atender à necessidade do serviço e definir critérios como: que uma delas atenda a determinado bairro, e outra a outro local, ou que uma atenda a determinado público, e outra atenda a outro público
– As entidades irão habilitar-se e candidatar-se, apresentando uma plano de trabalho em que constará o tipo de serviço, os custos, os profissionais e o tipo e capacidade de atendimento, entre outros, para uma comissão de seleção formada por representantes da prefeitura e de conselhos municipais
– A prestação do serviço poderá ser feita por mais de uma entidade, em sistema de rede, a critério do município. Mas, nesse caso, é a entidade vencedora do chamamento que manterá relação com a prefeitura, ou seja, que terá de prestar contas, inclusive, das instituições participantes da rede
– Para participar do chamamento, as organizações precisam estar em dia quanto à organização administrativa, à documentação, e não podem ter contas rejeitadas nos últimos cinco anos
– Há hipótese de dispensa de chamamento e casos em que não se pode exigir o chamamento, ou seja, quando só há um prestador de serviço, não há necessidade de seleção

OS REPASSES DE RECURSOS
– As verbas dos fundos nacional e municipal de Assistência continuarão sendo destinadas a partir do Fundo Municipal. Porém, só terão acesso as instituições habilitadas. Além disso, segundo o Tribunal de Contas do Estado (TCE), as entidades que estiverem adequadas à nova lei continuarão podendo captar recursos diretamente junto às empresas e por meio de destinação de Imposto de Renda
– Antes, eram os conselhos – o da Criança e do Adolescente e o do Idoso – que administravam o fundo, faziam os editais, selecionavam as entidades e informavam à prefeitura sobre qual entidade receberia quanto. A prefeitura acatava, firmava o convênio e repassava os recursos. A entidade prestava contas ao conselho, que se reunia, votava e aprovava as contas. Com o Marco Regulatório, o conselho fiscaliza, delibera, mas não abre edital. Isso é feito pela administração, que também recebe e avalia a prestação de contas
– A devolução de valores aplicados de forma irregular pode ser em dinheiro ou em forma de prestação de serviços. Se não forem sanadas as pendências, caberá ao prefeito instaurar uma Tomada de Contas Especial, que será remetida ao TCE, que, por sua vez, passará a tratar direto com a entidade e decidirá se as contas estão regulares, regulares com ressalvas ou irregulares
– Se o TCE avaliar as contas como irregulares, pode impor multa ao dirigente da entidade e fixar um valor a ser devolvido. Se a instituição não devolver, o TCE deverá emitir uma Certidão de Título Executivo e encaminhar à Procuradoria do município para que ele execute a cobrança judicial. Durante o processo, o TCE pode auditar a entidade
– Em função das novas regras previstas na Lei 13.019, as leis que criaram os fundos municipais terão de ser alteradas

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